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Talentos inflacionários, medidas macroeducacionais

Por Carlos Faccina
Notícia curiosa e reveladora aquela publicada em O Estado de São Paulo sobre a análise das intenções da inflação de resistir às ações macroprudenciais do Governo Federal. Especialistas encontram no mercado de trabalho indícios de que o dragão da inflação agora se alimenta de talentos. 

Isso mesmo! As empresas têm que pagar salários cada vez maiores para contratar novos funcionários, principalmente de olho dentro das paredes das empresas concorrentes.

O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostra que os salários de contratação na indústria cresceram 12% nos últimos 12 meses. Na média da economia, a alta foi de 10%.

Já em 2010, a pesquisa global CEO Study, realizada pela IBM (ler ”CEOS sofrem com apagão de talentos“), revelava que no Brasil, a falta de mão de obra especializada era o maior problema de 71% dos presidentes de empresas entrevistados. Uma percentagem bem acima da média mundial do levantamento, que é de 58%. A pesquisa foi realizada com 1,5 mil empresas, de 33 setores em 60 países, sendo 66 delas brasileiras.

Essa informação me fez lembrar do boi gordo no pasto. Em 1986, durante o congelamento de preços no Plano Cruzado, os pecuaristas esconderam o gado para esperar vendê-lo a preços mais altos. O presidente Sarney não teve dúvida, mandou a Polícia Federal para confiscar o boi no pasto.

Não seria de se estranhar uma ação nada prudencial de baixar uma Medida Provisória para que as empresas compartilhassem seus talentos a salários tabelados. Haveríamos de compreender a necessidade nacional de, acima de tudo, controlar a inflação.

Ou poderíamos esperar a mobilização de sindicatos reclamando que outros países inundam nosso mercado com mão de obra qualificada e barata que sobraria em outros locais do planeta (a importação de talentos já acontece em muitas áreas de especialização atualmente).

Comparações irônicas a parte, impressionante e reveladora, a informação confirma que estamos conferindo na prática um novo estágio da gestão dos problemas nacionais (e corporativos também).

A escassez de pessoal qualificado contrasta com o cenário de crescimento da demanda e, consequentemente, das indústrias presentes no país. Revela que, além dos problemas de infraestrutura e de tributos (e outros tantos já debatidos largamente), o Brasil não cuidou de investir na preparação de seu pessoal. Não falta gente querendo trabalhar, falta qualificação.

Cumprindo a lei de mercado, o talento escasso passa a valer ouro e pode ser “caçado” na concorrência porque os executivos já sabem: sem eles, o desempenho da organização será afetado. Esse valor da contratação já está seguindo para o preço do produto.

Seria de se perguntar se o valor que se destina ao combate da inflação via aumento de juros (no curto prazo) não seria melhor empregado numa educação intensiva e planejada para as reais demandas internas (no médio e longo prazos).

Não vamos conseguir combater a inflação provocada pela escassez dos talentos inflacionários com medidas provisórias. E não estamos falando de resolver essa questão para o próximo trimestre. Seria bom que a próxima reunião do Comitê do Banco Central indicasse a importância de ações macroeducacionais. Em educação, essa demanda só pode ser atendida hoje pensando nas duas próximas gerações. Quem sabe até lá a questão dos talentos não seja mais inflacionária.

Em tempo, é preciso ser dito que quem hoje colhe os frutos dos investimentos pessoais que fez em sua carreira recebendo assédio das principais organizações não tem culpa nenhuma pela inflação. Foram apenas premiados pelo bom planejamento, visão de longo prazo e muita dedicação.

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