Por Augusto F. Gaspar (*)
Quando foi a última vez que você saiu de casa sem o celular? Provavelmente você se lembra do dia, inclusive com detalhes: se chovia, fazia sol, onde esteve, com quem falou e o que fez. Ficar sem celular é uma situação estressante, e situações estressantes ficam gravadas em detalhes em nossa memória, devido a uma de nossas funções biológicas de autopreservação, que serve para evitar que cometamos o mesmo erro novamente e não voltemos a nos expor deliberadamente a um mesmo risco.
Considerando que ninguém morre por ficar sem celular, pelo menos em situações normais do dia a dia, por que tanto estresse? Por que nosso organismo interpreta a falta de um aparelho de comunicação como um risco de vida? A resposta está na importância que esses aparelhos, e as informações que eles carregam, têm para nossas atividades diárias, assim a sua falta nos dá a sensação de vulnerabilidade e perigo, interpretada pelos nossos mecanismos de defesa como uma ameaça.
Isso é um exemplo de dependência tecnológica e, quanto mais sofisticado e funcional for o aparelho, maior essa dependência se torna. Impossível não se acostumar a ter tudo na mão. Os usuários de smartphones que o digam: e-mail, agenda de compromissos e contatos, acesso a sistemas da empresa, acesso a informações diversas pela internet… E, claro, ligações telefônicas! Também criamos dependência de nosso computador e qualquer outro gadget com o qual convivamos, seja no trabalho ou em nossos momentos de lazer. Basta observar o que acontece nas empresas e nas residências quando há falta de energia elétrica… Ninguém mais trabalha e ninguém mais tem o que fazer.
A dependência tecnológica já é descrita por alguns autores como a “doença do século 21”, mas é importante observarmos que existe uma fronteira entre o que podemos chamar de dependência racional e dependência irracional. A primeira ocorre quando temos consciência do que estamos deixando de fazer por causa da indisponibilidade da tecnologia e buscamos meios para contornar a situação. Na dependência irracional, ocorre a total “parada” do sujeito até que se restabeleça a tecnologia ou o inverso: a total imersão no produto tecnológico até que ocorra uma interrupção forçada, exatamente o que ocorreu no famoso caso de um rapaz coreano que morreu de inanição após passar vários dias em uma lan-house imerso em um jogo. Isso pode ser chamado de doença.
Nas empresas usualmente somos dependentes da tecnologia de uma forma racional, temos soluções de contorno estabelecidas, mesmo que informalmente. O que não significa que devemos nos descuidar das medidas de segurança como back-ups, equipamentos redundantes e outros recursos que minimizem o impacto da indisponibilidade da tecnologia. E mais: além da dependência tecnológica das pessoas, a maior parte das empresas tem hoje seu negócio dependente da tecnologia. Processos, informações, recursos, tudo depende de equipamentos e de bases de dados, e é fácil deduzir que a dependência tecnológica nas empresas é diretamente proporcional ao tamanho da componente “conhecimento” do negócio. Portanto, podemos dizer que a gestão do conhecimento, por exemplo, amplia a dependência tecnológica da empresa.
A dependência tecnológica nas empresas nada mais é do que um “efeito colateral” do uso de soluções que agregam processos e conhecimentos, o que aumenta ainda mais a necessidade de medidas de prevenção à indisponibilidade da tecnologia, principalmente se considerarmos o valor que esse patrimônio de conhecimento representa para os negócios da empresa.
(*) Augusto F. Gaspar é Diretor da unidade de Professional Services da MicroPower e coordenador da coluna “Desenvolvendo Talentos” desta revista. Comentários e contribuições podem ser enviados para augusto.gaspar@micropower.com.br Twitter: augustofgaspar